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segunda-feira, novembro 25, 2024
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Sistema de mídia de um lado, sociedade de outro

Demorou, mas a organização não-governamental (ONG) Repórteres Sem Fronteiras (RSF) foi incisiva em seu relatório O país dos 30 Berlusconis, sobre a mídia brasileira (leia aqui sobre o documento), lançado no final de janeiro. Estão citados lá: concentração de mídia, veículos nas mãos de políticos, necessidade de um novo marco regulatório das comunicações… Ainda que estes problemas não sejam novidades, o fato de uma entidade internacional ter – finalmente – voltado seus olhos a estas questões reforça a importância do caminho rumo à democratização da comunicação.
Este foi o primeiro relatório da ONG sobre o Brasil desde a morte de Tim Lopes (2002). “Decidi fazer este trabalho porque o balanço da violência contra os jornalistas em 2012 foi muito ruim”, conta Benoît Hervieu, também jornalista e responsável pelo escritório das Américas da RSF.
No entendimento de Hervieu, que esteve no País em novembro, nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, o sistema político brasileiro impede o combate à concentração de mídia – e dificulta a adoção de um novo marco regulatório, ou uma Lei de Mídia, como na Argentina.
Confira a seguir a entrevista que o Sindicato dos Jornalistas do Município do Rio fez com Benoît Hervieu, via Skype, diretamente de Paris, na sede da RSF, na segunda-feira (28/1).
Qual foi a proposta da RSF com este relatório?
Estive no Brasil em novembro (de 2012). Foi a primeira missão da RSF no País desde a morte de Tim Lopes. Decidi fazer este trabalho a partir das grandes cidades – Rio, São Paulo e Brasília – por duas razões: primeiro porque o balanço da violência contra os jornalistas no Brasil em 2012 foi ruim, tivemos cinco profissionais mortos em função do exercício de seu trabalho. E também porque é interessante saber mais do quadro geral da imprensa brasileira atual diante das atividades esportivas internacionais que o País vai sediar. Outro ponto que busquei foi saber como os jornalistas das favelas cobrem a pacificação destas comunidades.

A concentração da mídia é um assunto com bastante espaço no relatório O país dos 30 Berlusconis.
Quem usou esta expressão, que está no relatório, foi o jornalista Eugênio Bucci, durante entrevista que fiz com ele em São Paulo. Mas não se deve fazer confusão com os veículos maiores que se tem no Brasil, como Folha e Estado, com os veículos regionais que estão nas mãos dos políticos e coronéis. Verifiquei que muitos políticos têm seis emissoras de rádio, duas televisões, quatro jornais no mesmo estado. Isso tem muito no Brasil, mas se encontra também em outros países na América Latina. A concentração não significa que a imprensa é ruim, mas revela falta de diversidade e pluralismo. No Brasil, o sistema midiático não corresponde à realidade de sua sociedade.
O Brasil é um dos países onde a concentração de veículos é mais gritante?
O fenômeno da concentração midiática existe em outros países. São seis grupos (que têm o monopólio) no Brasil, dois no Chile… Na Argentina existe a dominação do grupo Clarín. E quando se quer compartilhar o sistema midiático, aparece um confronto muito forte entre estes grupos, pois eles fazem confusão entre a defesa do interesse econômico com o valor de liberdade de expressão e imprensa. No Brasil, então, é mais complicado até pelo seu sistema político – de coligações diferentes em cada estado. Parlamentares, por exemplo, das comissões de Ciências e Tecnologia do Congresso se beneficiam de suas próprias decisões. É um conflito de interesses.
Na sua avaliação, é interessante para o Brasil adotar sua própria Lei de Mídia, aos moldes da Argentina?
Sim. Mas o problema é que no Brasil existe um federalismo forte, um poder local muito grande, com governadores e parlamentares de cada estado. Há sistemas de conflitos e interesses que teriam que ser resolvidos. Além disso, é um país muito maior (que a Argentina), com população maior. Existem certos estados onde há criminalização da mídia alternativa, sobretudo no Norte e Nordeste. Os mesmos donos da mídia são também os proprietários da tecnologia e ao mesmo tempo controlam o fluxo da frequência (emissoras). Então vai ser mais difícil. O Brasil precisa de um novo marco regulatório.
Foto: Reprodução
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