É um enredo dramático que, infelizmente, já foi presenciado antes: o jornal demite profissionais, descontinua cadernos, vende sua sede, sucateia a redação… Este roteiro, que parece ser também um manual de gananciosos empresários de comunicação, acontece atualmente com o histórico Jornal do Commercio, publicação carioca de 185 anos.
Em fevereiro, a direção da empresa deu fim ao Caderno de Cultura – o que motivou uma petição online que já tem mais de 400 assinaturas. Enquanto isso, entre 2012 e 2013, pelo menos sete demissões – algumas de profissionais experientes – deixaram a redação “abaixo do abaixo do mínimo” para funcionar, conta um jornalista do periódico criado pelo francês Pierre Plancher em 1827. “Parece que são 185 anos de história jogados pelo ralo”, lamenta.
Na virada do ano, Aziz Ahmed, jornalista que estava há mais de três décadas no Jornal do Commercio – sendo 15 anos como diretor de redação –, foi demitido. Com a dispensa de um profissional prestigiado, a direção da empresa colheu cancelamentos de assinaturas e até mesmo de anúncios.
Empregados que permanecem na empresa observam com temor o futuro do jornal. A administração de Maurício Dinepi, iniciada em 2003, já resultou em, lembra um jornalista, três levas de demissões de profissionais da redação. É a receita para a desconstrução de qualquer periódico.
O próprio Dinepi, na função de presidente do Condomínio Empresarial Diários Associados no Rio, tratou de maneira pouco amistosa uma comissão de defesa do Monitor Campista, outro centenário jornal que pertenceu a Assis Chateaubriand, na cidade de Campos dos Goytacazes. O veículo encerrou sua circulação em novembro de 2009.
“Dinepi até chegou a receber uma comissão nossa. Mas ele estabeleceu prazo curtíssimo para levantarmos dinheiro e comprarmos a marca do Monitor Campista”, lembra Vitor Menezes, atual presidente da Associação de Imprensa Campista. À época, os empregados – que receberam as indenizações trabalhistas corretamente, segundo o jornalista – ficaram sabendo da confirmação do fim da publicação um dia antes de ela acontecer.
“Para nós, Marcelo Dinepi é um cidadão de triste memória, que está vinculado a uma página muito ruim da história do jornalismo local (de Campos) por ter encerrado, de modo abrupto e injustificável, o Monitor Campista, que quando deixou de circular era a terceira publicação mais antiga do País”, lamenta Menezes.
O próximo passo no roteiro de crise de publicações, como o próprio Jornal do Brasil e O Dia entre outros, é mudar o endereço da redação. O Jornal do Commercio, juntamente com a rádio Tupi e Nativa, vai deixar ainda este ano o imponente prédio da Rua do Livramento, projetado por Oscar Niemeyer, e instalar seus computadores num espaço em São Cristóvão. Os Diários Associados, que congrega esses veículos de comunicação, vendeu o imóvel da Livramento e tem até setembro para entregá-lo.
Diante dessas movimentações, um empregado do Jornal do Commercio sacramenta: “Ele caminha para fechar.”
Ao Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio, a empresa disse que não haverá mais demissões na redação. O departamento Financeiro e Administrativo do jornal também afasta a hipótese de dar fim à publicação.
Na velha desculpa que costuma frequentar o vocabulário de empresários, as demissões acabaram sendo uma consequência de “reestruturação” e “adequação” à nova realidade dos jornais impressos, diz a direção da empresa.
Sobre os velhos tempos: em 1977, para comemorar os 150 anos do Jornal Commercio, o compositor Reginaldo Bessa criou um dos jingles marcantes da histórica da comunicação carioca – principalmente para os jornalistas que viveram aquele período. Escute aqui.