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sábado, novembro 23, 2024
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Comentário sobre possível agressão dentro de Sindicato gera reclamação de ouvintes

De Joseti Marques, Ouvidora Geral da EBC, no relatório bimestral agosto / setembro de 2014
A Ouvidoria encaminhou para dois demandantes, no dia 23/9, a resposta da coordenação da Rádio Nacional do Rio de Janeiro sobre a afirmação feita no programa Redação Nacional a respeito de uma possível agressão dentro do Sindicato dos Jornalistas.
Segundo o demandante João Sérgio Pereira (processo 84-RJ-2014), durante a entrevista com o presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), Celso Schroder, no dia 28 de julho, a apresentadora teria afirmado que jornalistas foram
agredidos dentro do sindicato do Rio de Janeiro durante uma reunião com ativistas.
“Me parece mais que a referida apresentadora tem seguido a mesma linha de outros veículos do Rio de Janeiro de criminalizar entidades sindicais”, argumentou.
Josemari Poerschke (processo 85-RJ-2014) também se mostrou incomodado com uma das falas feitas na entrevista. Em uma mensagem enviada à Ouvidoria, ele afirmou que a jornalista transmitiu as informações sem nenhum embasamento.
“Acompanhei toda a cobertura do referido episódio. Pude ver que a versão veiculada por veículos da Rede Globo, de que jornalistas teriam sido agredidos no sindicato, não é confirmada em outros veículos, mesmo alguns da grande mídia. Também verifiquei que tal fato foi desmentido pela Comissão de Ética do Sindicato dos Jornalistas, entidade autônoma do sindicato, sem vínculos que levassem a proteger a direção da entidade”, comentou o demandante.
Ele disse também que a entidade ligada aos ativistas deveria ter sido procurada para dar sua versão do ocorrido.
“Portanto, volto a afirmar que tal criminalização de uma entidade trabalhista, sem nenhuma errata posterior, desperta minha apreensão”, afirmou.
Para entender o caso
No dia 24/7, cinegrafistas e fotógrafos teriam sido agredidos durante a libertação de ativistas que estavam presos em Bangu (RJ), suspeitos de atos de vandalismo em manifestações. No dia seguinte, houve um encontro promovido pela ONG Justiça Global, na sede do Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, entre profissionais da imprensa e ativistas, conforme noticiou o Portal Imprensa. Segundo relato da reportagem, pais dos ativistas criticaram a imprensa pela forma que apresentaram o grupo. O evento já estaria agendado antes dos casos de agressão terem sido registrados na porta da penitenciária.
No dia 28/7, o programa Redação Nacional, da Rádio Nacional AM, do Rio de Janeiro, entrou no assunto da violência contra jornalistas. O presidente da Fenaj foi o convidado. Na cabeça da entrevista, a apresentadora cita o trabalho da federação em parceria com a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Logo em seguida, ela perguntou como Schroder tem acompanhado os últimos casos sobre agressões a imprensa.
A jornalista fez a abertura da entrevista da seguinte forma: “Schroder, antes de mais nada, ontem, domingo, você esteve reunido com alguns jornalistas que sofreram agressões, na última quinta-feira, na sexta-feira também um episódio de violência contra a categoria, dentro da sede do Sindicato dos Jornalistas do Rio, aqui no encontro, com os ativistas. Isso tudo provocou uma enorme comoção junto a categoria. Como a Fenaj vem acompanhado, né? A Fenaj pode, sim, acompanhar e
vem acompanhado, até onde eu sei” (sic).
Na resposta, o presidente da Fenaj comentou sobre a violência contra jornalistas no Brasil, fez uma explanação sobre a parceria com a Secretaria de Direitos Humanos e a proposta de federalizar crimes contra imprensa. Porém, ele não fez nenhuma referência ao possível ocorrido no sindicato, no Rio de Janeiro.
A entrevista seguiu sem qualquer outra menção direta ao caso. Ainda foi comentado o caso da morte do cinegrafista da rede Bandeirantes, Santiago Andrade, a violência em diversos estados e a criação do Observatório da Violência contra Comunicadores.
A resposta da coordenação da Rádio Nacional aos demandantes enfatizou que a emissora trata os variados assuntos de maneira clara, límpida e transparente. Segundo a nota da área, no caso específico da entrevista, “não houve intenção de
criminalizar qualquer instituição”. O texto finaliza com um agradecimento diplomático pelos apontamentos dos ouvintes.
Análise da Ouvidoria
É louvável para a prática do jornalismo a preocupação dos profissionais contra a onda de agressões e intimidações que acontecem em diversos lugares do país. Porém, este caso em particular revela o quanto é prejudicial um comentário sem a indicação de referência que possa corroborar o que é dito.
A jornalista poderia ter feito uma pergunta direta sobre o caso para o presidente da Fenaj: “houve agressão dentro do sindicato?”. A opção, na verdade, foi por uma fala que se confunde entre uma questão mal formulada e um comentário simplista.
A produção do programa também falhou. Mesmo com a presença de um entrevistado ao vivo não se exclui a necessidade do trabalho desse setor de apurar, organizar as informações e analisar previamente os desdobramentos da abordagem a ser feita ao longo da entrevista. Se na pauta havia a previsão de citar o encontro no sindicato, seria adequado o levantamento de um histórico sobre o caso, para fundamentar a discussão.
Há também outro aspecto a ser considerado. A atividade jornalística é um dos pilares do Estado democrático de direito, porém, é necessário conservar certa distância da forma de abordagem para que o debate não se transforme em apropriação dos microfones para a defesa de classe. Por mais legítimo que seja falar sobre os casos de violência contra colegas de profissão, tal situação não elimina o princípio básico da isenção. Assim, do mesmo jeito que o repórter precisa fazer um discurso impessoal quando o assunto é sobre saúde, economia e política, em questões ligadas à atividade que ele faz parte, a exigência permanece.
Quanto à resposta da coordenação da emissora, apesar de cordial, ela não indica quais serão as medidas adotadas pelo veículo. Se a informação está incorreta, ou seja, não houve agressão dentro do sindicato, no mínimo, uma correção poderia ser levada ao ar. Admitir os erros é um dos passos para a construção de uma radiodifusão sólida, plural e capaz de primar pelo respeito ao público.

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