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sábado, novembro 23, 2024
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Hesitação do Governo Federal na área da comunicação dá espaço para arbitrariedades da grande mídia

Coordenação Executiva FNDC
Passados quase dois anos e meio da Conferência Nacional de Comunicação, Governo Federal segue sem dar concretude às ações para transformação do marco regulatório do setor.
No último mês, criou-se a expectativa de que o Ministério das Comunicações colocaria em consulta pública um documento que retomaria o debate do novo marco regulatório do setor. O Governo afirma já ter um documento, sinalizou algumas vezes que haveria o lançamento, mas mais uma vez prevaleceu uma postura imediatista. Com a CPMI do Cachoeira, a disputa com os bancos pela diminuição dos juros e o projeto do Código Florestal em cima da mesa, o governo parece não querer lidar simultaneamente com mais um tema polêmico. O problema é que essa hesitação – que é regra de todos os governos nesse tema – deixa espaço para que o setor dos meios de comunicação, que não aceita mudanças nesse tema, siga cometendo todo o tipo de arbitrariedades.
O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação vem a público cobrar o lançamento da consulta e a abertura do debate público pelo Ministério das Comunicações, com amplos mecanismos de participação social. Quanto mais se espera um momento idealizado que não chegará, mais se acumula o déficit democrático que o Brasil tem no setor. Passados um ano e meio desde o início desse governo, a ausência de uma postura ativa do governo neste debate faz com que avancem no tabuleiro as forças conservadoras contrárias a qualquer mudança. A postura do Ministério deixa transparecer que o tema não é prioridade e que há pouca disposição em comprar briga com o empresariado do setor.
CPMI do Cachoeira
O exemplo mais recente é a atitude arrogante dos grandes meios de comunicação ao reagir em
bloco contra a possível convocação para depoimento na CPMI de um editor da revista Veja. Mesmo com 200 ligações telefônicas que sugerem uma relação promíscua do veículo com uma
fonte envolvida diretamente no crime organizado, prevalece entre os meios de comunicação um
espírito de corpo que prefere o obscurantismo à transparência, e trata a mídia como um setor inquestionável que não deve explicações a ninguém.
A liberdade de imprensa, que é uma garantia fundamental para sustentar o direito à informação dos cidadãos, é invocada justamente para defender o direito da revista em negligenciar tal direito. É preciso deixar claro que dificilmente qualquer marco regulatório dará conta de evitar o envolvimento de uma revista com o crime organizado. Neste caso, os fatos, se tratados com transparência, deveriam ser suficientes para afetar o ativo mais caro de qualquer veículo, que nenhum processo regulatório pode aumentar ou diminuir: a sua credibilidade.
O que um marco regulatório pode e deve fazer é ampliar o pluralismo e a diversidade no setor, de forma que qualquer reação corporativa se torne menor e insignificante frente às diferentes abordagens e perspectivas comprometidas com a liberdade de expressão e o direito à informação de todos os cidadãos e cidadãs brasileiros.
Também é o momento para se debater parâmetros éticos na distribuição de verbas publicitárias
oficiais. Não parece razoável que anúncios públicos sejam direcionados para veículos com suspeita de envolvimento com o crime organizado. Ainda que a mídia técnica aponte para uma grande audiência, é preciso horizontalizar e regionalizar estas verbas, que são públicas.
O caso absurdo da Band Bahia
Em meio a esse cenário turbulento, um caso absurdo ocorrido na Band Bahia mostra a fragilidade de nosso marco regulatório e a negligência do poder público. Em matéria pretensamente jornalística, uma repórter humilha de várias formas um cidadão negro detido por roubo e acusado de estupro.
Mais do que um problema específico de uma profissional, a matéria evidencia uma prática corrente de boa parte das emissoras em explorar o sensacionalismo e o preconceito a fim de conquistar mais audiência.
O Ministério das Comunicações pode e deve agir sobre o caso, aplicando o regulamento dos serviços de radiodifusão (decreto 52.795/63), que determina como obrigação das emissoras concessionárias “não transmitir programas que atentem contra o sentimento público, expondo pessoas a situações que, de alguma forma, redundem em constrangimento, ainda que seu objetivo seja jornalístico”. A multa para estes casos chega até 50 salários mínimos.
Lamentavelmente, em nota publicada por sua assessoria de comunicação, o Ministério das Comunicações afirmou simplesmente que não cabe ao órgão se posicionar quanto ao caso. Os cidadãos revoltados com esse caso pouco têm a fazer a não ser buscar abrigo nas ações do Ministério Público. Embora a Constituição Federal contemple que sejam determinados os “meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no Art. 221”, nosso marco regulatório não prevê sequer um órgão regulador que possa ser acionado e que tenha a atribuição de analisar o caso.
Os exemplos citados não trazem novidades, são apenas o retrato momentâneo de um problema de décadas. O FNDC espera que essa situação comece a mudar com o debate público sobre a comunicação que queremos e sobre quais os melhores instrumentos regulatórios para garantir pluralismo, diversidade e democracia. A sociedade já apontou mais de 600 propostas para isso na I Conferência Nacional de Comunicação, realizada em 2009. Passados quase dois anos e meio, não dá para o Governo Federal seguir hesitante em uma de suas tarefas centrais. É a democracia brasileira que está em jogo.
Salvador, 25 de maio de 2012.
Fórum Nacional Pela Democratização da Comunicação – FNDC

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