Com a lei nº 14.800, de 9 de janeiro de 2024, o governo brasileiro promove o reconhecimento merecido e inscreve o nome de Abdias Nascimento no livro de Heróis e Heroínas da Pátria. Como seus pares Antonieta de Barros, Zumbi dos Palmares, Machado de Assis, Chico Mendes, entre outros, estas personalidades dedicaram suas vidas para a construção de um Brasil realmente democrático.
Um dos registros da vida de nosso ex-senador foi sua trajetória como jornalista. Entre 1946 e 1948, Abdias Nascimento atuou no jornal Diário Trabalhista como redator e colunista – que seria o embrião do jornal O Quilombo. Em 1947, ele se filiou ao atual Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Munícipio do Rio de Janeiro (então denominado do Distrito Federal). Certamente uma atitude corajosa para a época – e, talvez, na atualidade – de um(a) responsável por um veículo de comunicação, neste caso produzido por negros(as), que buscasse registrar-se em uma entidade de classe.
A descoberta de sua ficha cadastral nos encheu de orgulho e inspiração para nominar uma intervenção na pauta nacional com o nome de nosso líder: Prêmio Nacional Jornalista Abdias Nascimento. Uma homenagem que ele acolheu com prazer, gravando um vídeo que a Cojira-Rio (Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial) exibiu no lançamento do concurso, 13 dias antes de Abdias ir para Orum, em 10 de maio de 2011, aos 97 anos. Outra homenageada neste prêmio também tem seu nome inscrito no Livro de Heróis e Heroínas da Pátria, Antonieta de Barros, que titulou a categoria Especial de Gênero.
Destacamos o agradecimento especial para a presidente do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro), professora e viúva de Abdias Nascimento, Elisa Larkin Nascimento, pelo denodo e determinação em não deixar que as marolas e ventos apaguem o nome de Abdias inscrito nas batalhas pelo avanço do Estado brasileiro por uma sociedade justa e igualitária.
Abdias Nascimento viveu o seu tempo no heroísmo, que se constrói na luta para o coletivo ter uma vida melhor aqui e agora. Se a liberdade cobra um preço a cada um(a) de nós, que desafia o poder concreto e real, a “quantia estabelecida” não deixou de ser paga por Abdias Nascimento, cujo sobrenome registra o que ele queria: o nascer de uma nova era para negras e negros no Brasil.
Em sua militância, Abdias, na qualidade de herói, lutou para encurtar cada vez mais o tempo de espera e consequente conquista por justiça e desenvolvimento para a população negra brasileira, que assim viveria em uma nação realmente democrática. De político a dramaturgo, de ator a artista plástico, de professor a jornalista, na mistura de todas essas atividades, ele aproveitou caminhos abertos pela ancestralidade e abriu outros para nós, seus descendentes na luta pela libertação de negras e negros na diáspora.
Como ouvimos certa vez em uma canção popular, “… herói é o cabra que não teve tempo de correr”. Talvez esta seja a melhor descrição, no cotidiano, de negras e negros heróis do povo como o é Abdias, que sempre viveu assim como continuamos vivendo, antes da paz prevalecer, “em um tempo de guerra”.
Miro Nunes e Sandra Martins, Jornalistas e membros da Cojira-Rio/SJPMRJ
Foto Luiz Carlos Gá